Dia Mundial da Poesia 21 de Março
Elegia do Amor
Lembras-te, meu amor,
Das
tardes outonais,
Em que
íamos os dois,
Sozinhos,
passear,
Para
fora do povo
Alegre
e dos casais,
Onde
só Deus pudesse
Ouvir-nos
conversar?
Tu
levavas, na mão,
Um
lírio enamorado,
E
davas-me o teu braço;
E eu,
triste, meditava
Na
vida, em Deus, em ti...
E,
além, o sol doirado
Morria,
conhecendo
A
noite que deixava.
Harmonias
astrais
Beijavam
teus ouvidos;
Um
crepúsculo terno
E doce
diluía,
Na
sombra, o teu perfil
E os
montes doloridos...
Erravam,
pelo Azul,
Canções
do fim do dia.
Canções
que, de tão longe,
O
vento vagabundo
Trazia,
na memória...
Assim
o que partiu
Em
frágil caravela,
E
andou por todo o mundo,
Traz,
no seu coração,
A
imagem do que viu.
Olhavas
para mim,
Às
vezes, distraída,
Como
quem olha o mar,
À
tarde, dos rochedos...
E eu
ficava a sonhar,
Qual
névoa adormecida,
Quando
o vento também
Dorme
nos arvoredos.
Olhavas
para mim...
Meu
corpo rude e bruto
Vibrava,
como a onda
A
alar-se em nevoeiro.
Olhavas,
descuidada
E
triste... Ainda hoje escuto
A
música ideal
Do teu
olhar primeiro!
Ouço
bem tua voz,
Vejo
melhor teu rosto
No
silêncio sem fim,
Na
escuridão completa!
Ouço-te
em minha dor.
Ouço-te
em meu desgosto
E na
minha esperança
Eterna
de poeta!
O sol
morria, ao longe;
E a
sombra da tristeza
Velava,
com amor,
Nossas
doridas frontes.
Hora
em que a flor medita
E a
pedra chora e reza,
E
desmaiam de mágoa
As
cristalinas fontes.
Hora
santa e perfeita,
Em que
íamos, sozinhos,
Felizes,
através
Da
aldeia muda e calma,
Mãos
dadas, a sonhar,
Ao
longo dos caminhos...
Tudo,
em volta de nós,
Tinha
um aspecto de alma.
Tudo
era sentimento,
Amor e
piedade.
A
folha que tombava
Era
alma que subia...
E, sob
os nossos pés,
A
terra era saudade,
A pedra
comoção
E o pó
melancolia.
Falavas
duma estrela
E
deste bosque em flor;
Dos
ceguinhos sem pão,
Dos
pobres sem um manto.
Em
cada tua palavra,
Havia
etérea dor;
Por
isso, a tua voz
Me
impressionava tanto!
E
punha-me a cismar
Que
eras tão boa e pura,
Que,
muito em breve — sim!
Te
chamaria o céu!
E
soluçava, ao ver-te
Alguma
sombra escura,
Na
fronte, que o luar
Cobria,
como um véu.
A tua
palidez
Que
medo me causava!
Teu
corpo era tão fino
E leve
(oh meu desgosto!)
Que eu
tremia, ao sentir
O
vento que passava!
Caía-me,
na alma,
A neve
do teu rosto.
Como
eu ficava mudo
E
triste, sobre a terra!
E uma
vez, quando a noite
amortalhava
a aldeia,
Tu
gritaste, de susto,
Olhando
para a serra:
— Que
incêndio! — E eu, a rir,
Disse-te
— É a lua cheia!...
E
sorriste também
Do teu
engano. A lua
Ergueu
a branca fronte,
Acima
dos pinhais,
Tão
ébria de esplendor,
Tão
casta e irmã da tua,
Que eu
beijei sem querer,
Seus
raios virginais.
E a
lua, para nós,
Os
braços estendeu.
Uniu-nos
num abraço,
Espiritual,
profundo,
E
levou-nos assim,
Com
ela, até ao céu
Mas,
ai, tu não voltaste
E eu
regressei ao mundo.
Teixeira de Pascoaes
In: Prosa e Poesia
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