terça-feira, 25 de outubro de 2011

A origem do Amor (ii)

                  
               











         L'enlèvement de Psyché

                 III

Pelo pretendente misterioso
Esperas d’amor sem o avistar
Do encontro fatal e misterioso
Daquele que ousaste amar

Resgate que não bastava
De coragem duma singela vida
Vede, o que tanto esperava
Como pudeste ser concebida

Tamanha beleza que hipnotizou
Por Zéfiro foste orientada
Ser testemunha de quem amou!
A um castelo que te deu morada

Cristina Gonçalves D' Camões (2011)

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

A origem do Amor


         L'enlèvement de Psyché
                  
                   I

D’Eros solta-se o sinal de partida
Para um encontro tão esperado
Do concílio que marcou a ida
Àquele momento tão aclamado

D’os genes eternos e imortais
Que tornara a deusa apetecida
Para o desconhecido marcado
Pelo sangue que lhe deu guarida

Psiquê que tanto esperas
Da aguardada imortalidade
Tamanha beleza desconcertante
Dessa perturbadora mocidade


                   II

A Deusa da beleza acorda
Tua perfeição cobiça despertou
Afrodite ordena e recorda
Que outros homens afastou

Dos seus templos esperam
A beleza, o culto e adoração
Doutra agora se apoderam
Mil homens e uma nação

Psiquê, simples e mortal
D’ Eros fatalmente atingida
Que nesse eterno sangue afinal
Foi colhido pela mesma ferida

Cristina Gonçalves D' Camões (2011)

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Ignoração estadística



                     Carl Spitz  - O poeta pobre        

A ignorância desfaz-se na corrente lavada
De espumas contraditórias e ondulantes.
Nesta mítica orgia e maléfica escada
De cognoscíveis desconcertantes.

Estes degraus fúteis e descontentes
Deste escárnio e maldizer patente
Do estúpido contentamento (des)contente?
Numa inevitável lavagem de mentes
                                         
Feliz do que nada sabe observar!
Desta maioria absolutamente ignorante,
Desta civilidade doente para matar
Proparoxítona esta política errante.

Dos que nasceram para nada fazer,
E ainda dos que simplesmente
Numa artimanha deambulam
Parasitas de uma antiga corrente.

D’uma gélida e fictícia nação
Estes senhores, este direito torto 
Até Deus ressuscita d’uma aparição…
E o poeta… Ai! Esse assistirá morto!

Cristina Gonçalves D' Camões (2011)

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Soledad

Salvador Dalí - Reminescense

Vieste sem avisar.
Marcaste o teu espaço.
Aqui e ali...
Os livros,
As folhas rasuradas,
Os pensamentos,
A música...
O ruído de ti.
Levaste contigo:
O silêncio,
A força,
Os pedaços.
D’ uma vida
D’ encontros
Desencontros.
Silêncios que calaram
O que parecia invencível.
Levaste contigo:
O (re)encontro,
A energia destas
E dessas mãos
Quebradas,
Presas nesse caminho
Que ainda não nasceu.
Levaste as madrugadas
Sem dormir,
Sem pensar,
Onde o tempo
Deixou de existir.
Histórias que contava
Ao pé do crepúsculo,
Foram deixadas para trás...
He aqui la soledad de onde
estás ausente!

Cristina Gonçalves D' Camões (2011)

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Teixeira de Pascoaes

Pascoaes foi e será para sempre uma mente prodigiosamente fecunda, pela sua imensa atividade intelectual e pela exclusividade de pensamento. Para mim talvez o maior poeta-filósofo contemporâneo do Pensamento Português.

Sobre a sua alma grandiosa residiu um espírito ondulante de conteúdo, único e de inteligência subtil, que encarnou num só homem todas as possibilidades do conhecimento humano. Tal como um vulcão, incendiou completamente os modos de pensar, sentir e agir do final do séc. XIX e princípios do séc. XX. A
nossa alma portuguesa fez-se carne nas suas obras, não só pela sua essência saudosa, mas também pelo orgulho que encerra este sentimento único de lusitanidade.

Tal como afirmou Eduardo Lourenço em Pascoaes os contrários não se opõem e a contradição não exige múltiplos eus para suportar inconciliáveis visões do universo, tudo é só uma realidade, misteriosamente a mesma e o seu contrário.



“Desejei falar de mim, neste livro. Falei dos outros, afinal. Mas quem somos nós senão os outros? Um homem é todas as cousas que ele viu e todas as pessoas que passaram por ele, nesta vida. (…)

Alegro-me de ser. Ao menos, vi as estrelas, o mar, o Marão, o pôr do sol, entre, os pinhais, a Lua pousada, por instantes, num cerro montanhês, a primavera e o teu pequeno vulto, meu Anjinho!

Alegro-me de ser, porque amo e sofro; espero e desespero, choro e rio; cantando, elevo-me às estrelas e há silêncios que se abrem em mim, tão profundos como a noite!

(…) Sim, há horas em que a vida nos esmaga e esfarrapa! Somos como um papel escrito nas mãos insatisfeitas dum poeta, esse animal raivoso. Voamos aos quatro ventos! (…)

O homem nasce e morre várias vezes, desde que sai do berço até que entra no seu túmulo. Viver é nascer a toda a hora.

O homem não vive: nasce e morre.

Viver vivem as árvores… e algumas criaturas que conheço, perfeitamente vegetais. (…) E vive a donzela, que é uma flor…

O homem nasce e morre. É um vagido e um último suspiro. A palavra foi dada às palavras e às árvores e às do donzelas… Percebe leitor? Desculpará… Pedir desculpa é a própria base do edifício social. O leitor, se é comproprietário desse belo edifício, ficará a simpatizar comigo e será capaz de me ler até ao fim! Ainda bem!”



In: O Bailado, Teixeira de Pascoaes